sábado, 23 de março de 2013

Mozart condenado

 


"Sentei-me diante de um casal. Entre o homem e a mulher, a criança lá conseguira arranjar o seu buraco e dormia. Virou-se, mesmo a dormir, e vi-lhe o rosto à luz da lâmpada. Ah! que rosto adorável. Aquele casal produzira uma espécie de fruto dourado. Aquele rebanho pesado originara este êxito de encanto e de graça! Debrucei-me sobre aquela fronte lisa, sobre aquele suave movimento de lábios e disse para mim: "Aqui tenho eu um rosto de compositor, aqui tenho Mozart em criança, aqui tenho uma bela promessa de vida!" Os principezinhos das lendas não eram diferentes dele. Protegido, cercado, cultivado, que não poderia ele vir a ser? Quando, por mutação, nasce nos jardins uma rosa nova, lá se comovem todos os jardineiros. Isola-se a rocha, cultiva-se a rosa, favorece-se a rosa... Mas não existe jardineiro para os homens. Mozart menino será marcado, tal como os outros, pela máquina batedora. Mozart virá a ter as mais altas alegrias da música apodrecida no fedor dos cafés-concertos. Mozart está condenado..."

Antoine de Saint-Exupèry
Um Sentido para a vida

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