Pois bem, que o cinema
norte-americano não foi materialista não significa que não foi liberal. Se o
primeiro principio liberal é o da “absoluta
soberania do indivíduo com inteira independência de Deus e de sua autoridade”,
a comprovação que nos apresenta a ampla maioria dos filmes surgidos de
Hollywood – mais além de ocasionais invocações de Deus- pode resumir-se em umas
palavras de Pio XII: “Com freqüência a
Deus não se nega, nem se lhe injuria nem se lhe blasfema; apenas Ele está
ausente. A propaganda de uma vida terrestre sem Deus é aberta, contínua. Com
razão se observou que geralmente, ainda nos filmes considerados moralmente
irrepreensíveis, os homens vivem e morrem como se não existisse Deus, nem a
Redenção, nem a Igreja. Não queremos colocarmos a discutir as intenções, mas
não é menos verdadeiro que as conseqüências destas representações
cinematográficas são já extensas e profundas”. Mais ainda e ao contrário
desta impossibilidade, em muitíssimos casos nem sequer é dado advertir uma
visão do diretor de onde mais além de seus personagens, ele se pode criar uma
estrutura secreta que nos conduza a compreender uma Ordem na qual o homem não
pode subtrair-se a Deus (como muito bem mostrou Hitchcock em seus filmes não
explicitamente católicos; respeito a visão do cinema sobre o mistério e o
transcendente ampliamos em outro capítulo deste nosso livro, como também o
estudo ilustrado “La mirada de Alfred
Hitchcock”).
David Wark Griffith, o gênio inventor do cinema.
Levou em si as contradições próprias do que dominou a América.
Levou em si as contradições próprias do que dominou a América.
Voltamos à esta contradição
que marcou desde seus começos o cinema estadounidense. Uma das mais claras e
primeiras manifestações deste conflito e esta rápida utilização do cinema por
parte do poder se pode ver no mesmo Griffith. Filho de um general derrotado na
Guerra de Secessão, demonstrou seu claro destacamento à causa sulista com sua
monumental obra magna, “O Nascimento de uma Nação” (1914). Sem dúvida, esta
inocultável proposta “dixie”, esta superprodução de um derrotado não o impediu
colaborar explicitamente com o vitorioso liberalismo maçom, como pode ver-se
nas versões ingênuas e propagandísticas de “Hearts
of the World” (filmada por expresso pedido de Lloyd George, primeiro
ministro britânico durante a Primeira Guerra), “América”, “Abraham Lincoln”,
ou “Orphans
of the Storm”. Se podia dar-se ao gosto de glorificar o Sul, de um modo
romântico, superficial e encantador, não podia colocar em questão o caráter
predestinado da América nem indagar acerca da verdade histórica, entre outras
coisas do assassinato de Lincoln. Cremos que não foi até “O Nascimento de uma Nação” se não quando o poder político-economico
dominante nos Estados Unidos advertiu e compreendeu o poder persuasivo do
cinema – como o compreenderam por isso então os comunistas russos financiados
pelos banqueiros norte-americanos (por certo, o quê até 1916 León Bronstein,
mais conhecido como Trotsky, participando como extra de cinema na costa
oeste?).
O crescimento dos grandes
estúdios esteve ligado – coisa que nunca se disse mas resulta obviamente – com
o financiamento dos bancos, muitos em mãos de seus paisanos (o primeiro em
financiar a estes produtores em seus primeiros passos foi o Bank of America;
logo Morgan e Rockefeller; Warner foi sustentado por Goldman, Sachs & Co.).
Sem dúvida, não queremos simplificar dizendo que esta condição foi decisiva na
hora de filmar um filme, desde já, se não que a orientação geral de uma grande
estúdio diante de um feito importante (Guerra), educativo (História) ou tema
influente (Religião) na sociedade, não podia resultar independente de
semelhantes poderes que, o repetimos, se estavam fazendo por aqueles anos com o
controle dos resortes mais importantes da economia norte-americana. Não ver
isto e pretender que os magnatas dos estúdios não recebiam nenhum grau de influência
por parte dos donos do poder econômico norte-americano é algo muito ingênuo.
Vale à pena deter-se aqui para confrontar certas proposições que sobre
Hollywood foram vertidas por Ángel Faretta, em oposição à muito difundida
opinião de que o cinema de Hollywood
veria a ser “o ópio dos povos”, coisa que negamos, pelo menos se vê em termos
absolutos.
Continua...
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